sábado, novembro 28, 2009

Questionando Cronos


O tempo cronológico dividido em momentos [ instantes, fragmentos, pedaços, porções, cagagésimos ] mensuráveis de dimensão diversa - anos, meses, dias, horas, minutos, segundos, etc. - o tempo dizia, é uma invenção, concepção e conceptualização humanas, assim como os instrumentos concebidos e fabricados pelo ser humano para medir e registar o tempo - a ampulheta, o relógio, o cronómetro, etc. O tempo é o Homem que o pensa e o faz.


Imaginemos que um fenómeno trágico de proporções inimagináveis - mas mesmo assim imaginemos... - destruía toda a vida biológica na Terra, e só a vida orgânica, nomeadamente a Humanidade. Por exemplo, uma espécie de 'bomba atómica bioquímica', que destruísse só os seres vivos e deixasse intactos e funcionais os objectos, máquinas e equipamentos.


Durante algum tempo os relógios continuariam a funcionar, presume-se. Mas não haveria ninguém humano vivo para os usar e neles medir o tempo e ver as horas.


Neste contexto podemos dizer peremptoriamente que, p.ex., a 'hora' continuaria a existir per si?


O tempo, enquanto carácter universal e 'constituinte' da matéria [ continuum espaço-tempo ] continuaria a existir, claro, e continuaria a passar, se é que 'passa'. Tempo é devir, é mudança, é movimento.


Mas sem haver ser humano para usar o conceito de tempo, para intuir, para nomear e usar a noção de hora e medi-la podemos dizer que esta continuaria a existir?


Enquanto pedaço de tempo no fluxo deste, sim. Mas enquanto conceito? Enquanto ideia? Sim ou não?


Inclino-me mais para o NÃO...


Aceitam-se sugestões.


imagem © josé antónio • comunicação visual


quinta-feira, novembro 26, 2009

sou munta feio por dentro


Desde rapaz sempre me achei feio. Verdade, verdadinha. Apesar de a minha mãe e o meu pai, a minha avó, as minhas tias e demais familiares, e vizinhas e amigas delas, me dizerem, e dizerem umas às outras, que eu era um rapaz tãããããão bonito, tãããããão lindo, sempre que olhava o meu rosto orelhudo e grosseiramente triangular no espelho... achava-me feio. Não havia nada a fazer. Prontos!


As orelhas pareciam-me pontiagudas e desproporcionadas para o tamanho do rosto. E de abano, inda por cima.

Sentia-me um cruzamento dum elefante com um reco assuinado. Aliás, trombas era o que não me faltava!

O meu ar, para mim, ligeiramente merceeiro talvez fosse herança genética do meu bisavô, taberneiro em Torres Vedras. Ou dos meus ancestrais circenses, certamente, por via deste facto, algo labrêgos.


O facto das moças da minha idade, por algumas das quais eu tinha um interesse que transcendia a simples amizade, dizia-me o meu estranho em crescendo pénis, talvez fosse por via do doce odor a qualquer coisa que eu não sabia bem o que era e que exalavam dos corpos e das bocas, não sabia pois nós rapazes, com quem mais andava nas cavaladas, a única coisa a que cheirávamos era a suor, a chulé e a merda, as moças dizia, não se manifestarem a esse respeito, não dizerem nada ou limitarem-se a uma espécie de assim-assim pois 'tá bem, julgo que em muito, imenso, contribuía para esse meu auto-juízo estético.


O meu corpo também não contribuía em nada para melhorar o meu aspecto. Ligeiramente lepsossomático, e de baixa estatura, a minha musculatura era rude e algo angulosa. Subir às árvores torna-nos parecidos com elas. Ficamos com os membros e músculos retorcidos e nodosos como elas.


Tinha apenas uma coisa a meu favor. Tinha o que se chamava ombros de alfaiate. Esta disse uma das minhas tias-avós, a tia Elvira, irmã da minha avó Angelina. Ombros altos, era o significado da expressão. Sim, tinha os ombros altos, o que era uma vantagem com a roupa, que de um modo geral me assentava sempre bem. O senão dos ombros, notava-se na praia, era serem um tanto ossudos. O que se disfarçava pondo a toalha de praia por cima deles...


É claro que este juízo que eu fazia de mim mesmo se referia apenas ao meu exterior. À res extensa visível.

O meu interior estava-me interdito e não passava das goelas para baixo. E para isto, para ter um leve vislumbre do meu interior, tinha que abrir a bocarra em frente ao espelho, imaginando o que existiria por ali abaixo.

Haviam as radiografias, óbvio. Mas pouco mostravam. Umas manchas brancas a revelar os ossos do esqueleto e era tudo.


Sempre podia comparar-me, e imaginar-me, com um frango, quando via a minha mãe ou avó a arranjarem algum para o almoço. Aquela ensanguentada tripalhada toda sempre me dava uma ideia aproximada de como eu era por dentro. Não devia ser muito diferente. Claro que não teria moela... Mas o aspecto dos ogãos não deveria andar muito longe se me abrissem de alto a baixo e me estripassem.


Tudo isto até há dias ter ido fazer uma ecografia abdominal e os meus piores receios confirmaram-se. Se eu achava que sou feio por fora, que dizer do interior... Blharg!


Horrendo! Simplesmente horroroso! Veio-me à ideia o "Alien, o Oitavo Passageiro"! Se há um Deus, onde é que ele anda!?


Confirmem por vós próprios na imagem que aqui vos deixo:



sexta-feira, novembro 06, 2009

No Vale do Rio Seixe


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