domingo, abril 25, 2004

o pai natal existe.

Claro que acredito na existência do pai natal.
Ele existe mesmo.
O que não entende quem nele não acredita é que ele é um ser polimorfo capaz de assumir as mais diversas formas e aparências e manifestar-se com o aspecto que desejarmos.
Na minha vida sempre me apareceu sob a forma de familiares e amigos. E sempre me deu presentes.

Talvez, precisamente, porque sempre acreditei nele!

portugal, país de pandeleiros.

Humilde contribuição para uma futura "Grande Enciclopédia do Bem Falar e do Bem Escrever a Língua Portuguesa":

Pandela - s. m. (do gr. paneyós, do b-lat. panna ou do lat. pandellum através do cast. pandelò), instrumento musical de sopro e percussão accionado por uma haste grossa, rígida e lubrificada que, por acção do tocador, executa um movimento de vaivém numa espécie de cabaça dupla, através de um orifício habitualmente estreito situado no rego da cabaça.
O som é produzido pelo bater ritmado da haste nas paredes interiores da cabaça, enviado por tubos internos e amplificado por um dispositivo 'labial' que produz ressonância e que emite um som do tipo 'Ai-Úi'.
A amplitude e qualidade sonoras dependem da lubrificação da haste, da qualidade da cabaça, da técnica e da destreza do tocador.

Pandeleiro - s. m. (de Pandela), 1. tocador de Pandela; 2. fabricante de Pandelas; activista ou agente da pandeleirice, do pandeleirismo (V.); 3. sinónimo de ministro.

existência, essência.

Nenhuma tem o primado sobre a outra. Nenhuma precede a outra. Ambas se constituem num esquema de simultaneidade no instante de afirmação do Ser . Ser que não-era e que passa-a-ser. Assim se afirmam o corpo e o espírito. Numa simbiose iniludível e indissolúvel, até à sobreviência da dissolução de ambos no vazio, no nada.

Com o que se desintegra aquele ser particular, contingente.

na minha terra as cotovias são pretas.

Olha um melro.
Não é, é uma cotovia.
É um melro!
Aquilo é preto, as cotovias são cinzentas com pintas escuras. Ah, e não poisam nas árvores.
São pretas!
Só se for na tua terra...
São pretas, porra! As cotovias são pretas. Então eu não sei o que é uma cotovia!?

O sábio aponta para a Lua, o ignorante olha para o dedo.

não tenho que ser inteligente

Eu não tenho que ser inteligente pelos outros.
Bem me basta o esforço para eu próprio ser inteligente.
Penso, apresento as minhas ideias, argumento-as.
Fica ao critério de cada um pensá-las, julgá-las, aceitá-las ou rejeitá-las.

Homines quod volunt credunt (Os homens acreditam naquilo que querem)

devo ser um génio...

Oiço tocar um despertador.
Não fui eu quem o pôs para aquela hora.
Deduzo que foi a outra pessoa.
Vejo que ela não acordou.
Acordo-a eu.

sou um génio certamente!

como diria a minha falecida avó:

"Você" é estrebaria. Eu dava palha e você comia.

quinta-feira, abril 08, 2004

elo perdido...

Quando Darwin morreu e chegou ao pé de Deus, disse-Lhe:

— Olha, só lamento nunca ter encontrado o elo perdido.

Ao que Deus respondeu:

— Pois claro que não encontraste. Não acreditavas verdadeiramente nele. Porque... o elo perdido sou Eu!


"nisi credideritis, non intelligetis."

elogio clitoridiano...

Estava na hora, no minuto, no segundo, no décimo, no centésimo, no milésimo, no avo. Estava no momentum.
Sentiu o impulso incontornável, electrizante, fremente e vibrátil. A memória do aroma e do sabor fez-lhe eriçar os pêlos da nuca e espreguiçar o pescoço de furúnculos adiados e carótidas obscenamente palpitantes. A fronte encheu-se-lhe de gotículas sudantes. Não podia, não conseguia, não queria, esperar mais.
Como uma fedorenta tainha fora de água, de boca escancarada como se lhe faltasse o ar, caiu de borco. A língua saltou-lhe da boca como se fora um camaleão à cata dum insecto. E como um camaleão revirou os olhos em todas as direcções, sofrêgo, em busca da humidade quente. O véu grosso que se opunha ao desejo partilhado foi escorraçado para uma galáxia a 7 000 anos-luz, ali para os lados do braço de Perseu.
A consumação foi lenta e rigorosa. Metódica. Cirúrgica. O tempo eternizara-se. Simplesmente, ou talvez complexamente (quem o poderia dizer?), trombou. Alto e bom-som troaram as trombetas.
Era um magnífico trombeiro!

"Não é para quem quer mas para quem pode" diz o povo.
"Não é para quem quer nem para quem pode mas... para quem sabe!" digo eu, que gosto de dizer coisas...

saber veraneante.

Esta ideia emergiu subrepticiamente no meu espírito quando vinha na camioneta (subliminaridade do tremor, físico e não kierkegaardiano..., causado pelo 'maxibombo'?)

Estava a pensar naquelas pessoas que dizem que conhecem muito bem uma localidade, zona ou região apenas porque passaram por lá meia dúzia de vezes em viagens de férias ou trabalho.
Passaram, olharam à volta e muitas vezes nem sequer pararam para beber um café ou tirar uma foto do sítio ou passear um pouco pelos 'becos', para reparar no tal pormenor insólito ou característico que não vem descrito em lugar algum.
Ou mesmo para dar dois dedos de conversa com os autóctones e conhecer os seus 'seres e saberes' (onto-antropo fundamental à gnose e ao logos).
Mas dizem que o conhecem muito bem...

Conhecer bem um lugar significa ter vivenciado esse lugar, ter lá vivido durante algum tempo (muito ou pouco é subjectivo e mesmo variável no interior da própria subjectividade do 'ego', ou seja, para o próprio 'o muito de ontem pode ser o pouco de agora'...).
Ter 'saboreado' o lugar com a plenitude do corpo e do espírito.
Ter tido emoções, sensações, visões e paixões nesse lugar.
E essas paixões não terem sido fugazes, de passante e de passagem, mas sim profundas e perenes, daquelas que se gravam a fogo no corpo e na alma como uma tatuagem indelével que um dia volta ao pó connosco.

Ocorreu-me que esta ideia pode ser transposta para o intelectual.
Pode-se ter um 'saber veraneante' de uma ideia, de uma área do conhecimento, de um livro, da arte, da ciência, da religião, etc., do que quer que seja que pertença ao universo da cultura e da intelectualidade.

E há tantos portugueses veraneantes da cultura...