segunda-feira, julho 26, 2004
segunda-feira
Porque razão há tantas segundas-feiras a começar mal?
Será que algum ente transcendente, zeloso do nosso logos, o provoca para nos fazer perceber a realidade das leis de Murphy? Será que afinal Deus existe e eu O ofendi? Ou será que eu fiz mal a alguém!?
Eram pr'aí 9,30h. quando o telemóvel dela tocou. Não o normal toque de despertar, ao qual me tornei insensível, mas o irritantezinho crescendo 'musical' de toque de chamada.
Adoro música clássico-erudita, mas tocada por orquestra sinfónica, e detesto estes toques polifónicos, estas pseudo-músicas, que me ferem a sensibilidade auditiva e me soam a grilos cibernéticos, criados por um qualquer louco dr. Frankenstein da electrónica digital.
Se eu quisesse ouvir grilos comprava uma casa no campo e ia viver para lá. Ou nunca tinha de lá saído.
Sou um tipo simples e acho que um telemóvel é um telefone, e como tal deve soar como um, e não como um brinquedinho de criança.
O toque, ali a um metro e meio do meu ouvido, na mesa-de-cabeceira dela, despertou-me, agrediu-me como uma adaga, um balão de vidro explodiu dentro do meu crânio, tirou-me de um sono que eu pretendera repousante.
Apesar de me ter deitado por volta da 2h., o forno em que este Julho transformara o meu quarto, só me permitiu adormecer lá pelas 5,30h. Como tenho a sorte, ou o azar, de ser profissional liberal e trabalhar em casa, apesar de me irritar um pouco o adormecer tão tarde, isso é compensado pelo levantar também tarde, lá pelas 12/13h., pelo que acabo sempre por conseguir dormir um número de horas aceitável. Mas hoje, segunda-feira, isso não aconteceu.
Depois do toque do telemóvel veio a inabitual e anacrónica voz dela, ao atendê-lo. Normalmente, ela não faz barulho de manhã, ou o pouco que faz, já me habituei a ele, e por isso consigo continuar a dormir. Também não é costume ela atender o telemóvel tão cedo, na cama. Se o faz, fá-lo na sala ou na cozinha, pelo que a voz dela não me perturba o sono. Apenas costumo acordar quando ela me beija, me diz adeus até logo e sai. E mesmo isto apenas por breves instantes, insuficientes para me sacarem completamente dos braços de Morfeu. Em regra, adormeço de imediato. Desta vez, a coisa foi diferente, muito diferente.
O toque, a voz ali mesmo ao meu lado, o teor da conversa que me levou a perceber o que tinha acontecido... Não consegui voltar a adormecer.
Detesto a irresponsabilidade. Detesto quando isso me perturba directamente e interfere nas minhas rotinas e nos meus planos. Detesto quando isso perturba e prejudica a pessoa que amo. O que acontece com uma frequência assustadora.
Quem tão cedo telefonava para ela e nos lixou o sossego que julgo merecido, era a senhora da limpeza. Estava em casa dos pais dela, sem poder entrar para cumprir as tarefas para que fora contratada, pois a porta, que devia estar aberta, estava fechada.
Na véspera, tinhamos lá estado. Ela tinha combinado com o irmão, mora ali muito perto, que este passaria por lá, cedo, antes de ir levar as crianças aonde as costuma levar, para abrir a porta e soltar no quintal a cadelinha, que fica fechada dentro de casa durante a noite. Tinham combinado mas ele não cumprira. Esquecera-se com certeza. Ou então acordara tarde, como de costume, e já não tivera tempo para passar pela casa.
Recordei-me daquele "um ou dois cigarritos" que me cravara na véspera antes de se ir embora. A 'ganza' antes de deitar talvez estivesse na relação causal que provocara ou o esquecimento ou o atraso...
Ela falou com a senhora da limpeza, pediu-lhe para esperar um bocadinho, apressadamente saltou da cama e pôs de lado o seu próprio ritmo, a sua própria rotina, para resolver o problema, como se a irresponsabilidade fosse dela.
Nem teve tempo para se arranjar em condições, e é uma pessoa que o costuma fazer com sensibilidade e gosto. Comeu apressadamente, pegou num saco no qual colocou roupa para se vestir lá em casa, e saiu como um tiro em busca de um táxi, para chegar o mais rápido possível, e assim evitar à mãe, em férias algures, pagar horas-de-espera-sem-trabalhar.
Enquanto ela devorava apressadamente uns flocos, sentada à mesa na cozinha, ainda a tentei chamar à razão e fazê-la perceber que não lhe fazia bem à saúde estar naquela nervoseira e ansiedade, que isso só lhe agravava o stress e os problemas de tensão arterial e colesterol que ela têm, que ela não pode assumir os problemas dos outros como problemas seus, que ajudar os outros é uma coisa e viver os problemas deles como nossos é outra e um erro, porque não, telefonar para o irmão, que talvez estivesse lá perto, e se não estivesse, pelo menos para o chatear para ele perceber que tinha feito merda como de costume... Foi inútil.
Ela saiu e eu... Voltar para a cama não valia a pena. A tensão em que eu próprio acabara por ficar, os adivinhados lençóis quentes da noite, nesta manhã que começa a abrasar, cá dentro ainda estão os mesmos 30° das 3h., sei que me é impossível adormecer. Tenho a segunda-feira lixada. Começou mal a semana.
Às vezes sinto-me tão impotente para a ajudar com a saúde dela.
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